quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Quase um Adeus!

Ouça o que eu tenho para lhe dizer
Mesmo que já tenha sido dito
O momento é necessário apesar de maldito
Todo mundo precisa ouvir “adeus” para entender que acabou.

O tempo passa como gotas que caem do meu rosto
Uma após a outra, lágrimas de marcar estações
Cobrando seu pedágio por todas as sensações
Boas ou más, sempre intensas, mesmo que não sentidas

Tempo. Lugar de guardar as coisas que na vida acontecem,
Organizador da coexistência de todos os momentos
Que em cada um de seus muitos compartimentos
Guarda tudo, na síntese errante de um único ser

Somos o resultado tangível do invisível que vivemos
Existências irreais dos sentimentos carnalizados
Emoções construídas em peitos dilacerados
Sintomas de som, calor, suor, pele, beijo

Você aprendeu a viver com a dor de existir
E me ensinou a conviver com o absurdo da solidão
Amor sentido nos sentidos, sempre não
Retidos todos, ressentido coração.

Agora, eu, peso o peso do caminho percorrido,
E você, leve o leve do caminho que nos resta
Enquanto escrevo, a paciência insiste, a dor me testa
Deixo que tudo seja como simplesmente tem que ser.

Luz!

Ao contrário do que pensamos não somos capazes de ver as coisas como elas são.
Nos limitamos a simplesmente perceber a luz que essas coisas refletem.
Se a luz é muito intensa, tudo, inclusive o preto, se torna branco.
Se sem nenhuma intensidade, tudo, inclusive o branco, se torna preto.

Quando vemos dois objetos de mesmo tamanho recebendo mais ou menos luz
Percebemos tamanhos diferentes entre eles.
Se mais luz, maiores, se menos, menores.

Olhar para um objeto pouco iluminado é não ver seus detalhes.
Olhar para um muito iluminado é como tatuar a sua forma na retina
A ponto de mesmo quando não se está mais olhando para ele
A imagem permanecer na sua frente, sobreposta a tudo
A despeito da ausência do objeto que se viu

Somos seres extraordinariamente fascinados pela luz.
Há aqueles como insetos que sacrificam a própria vida para alcançá-la.
Outros como morcegos gabam-se de não precisar dela
E vivem a vida semelhantemente regida por sua ausência,
Necessitando de sua existência, pelo avesso.

Nós, seres sem qualquer luz própria
Achamos graça da maior de todas as luminárias
E tudo que fazemos, fazemos daquele jeito ou naquela hora
Dependendo da posição que ela esteja.
Insistimos em lhe atribuir responsabilidade pelos momentos
Mais sublimes de nossas existências, quando ela aparece ou some atrás do horizonte
Num repetitivo e sempre novo ritual de cada dia
Que ela mesma nem sabe que nos proporcionou.

Iluminamos para nos sentir seguros.
Se vemos a luz refletida nos objetos podemos analisar o tamanho do perigo
E decidir se corremos para o ataque ou fugimos do inimigo.

Quando precisamos de mais energia apagamos os luzeiros menores
Para que tudo se torne solidão a nossa volta.
Acalmamos os sentidos mais ocultos de nossos corpos
Para percebermos que dentro de nós ficaram inúmeras impressões
Produzidas por incontáveis objetos iluminados ao longo de todo dia
Que precisam ser devidamente digeridas através de processos mentais
Que convencionamos chamar sonhos.

Somos viciados em luz!
Mesmo cegos, queremos senti-la por perto.
Saber que ela está lá.
Se não para vermos, quem sabe, pelo menos para sermos vistos?
Talvez por outros viciados.
Talvez pela Luz que nos viciou.


“Marcello Guimarães, de 34 anos, que perdeu a visão no início da adolescência. É instintivo: à noite, quando entra em casa, o primeiro movimento que faz é o de tatear a parede em busca do interruptor. “É puramente emocional. Eu percebo a presença física da luz, ela preenche o espaço e eu não me sinto sozinho quando a luz está acesa. A escuridão me dá a sensação de vazio. Se não acendo as luzes, é como se o meu lar estivesse abandonado. Não enxergo nem mais, nem menos com a luz. Mas a presença dela é reconfortante”. – Jornal O Globo